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quarta-feira, 11 de maio de 2011

AS FASES DA ESPERA

                Por  Ferreira K. P.
               
              Assim como a lua a nossa vida é baseada em fases. E por coincidência também se manifesta de quatro formas. Só que são fases com nomes diferentes, mas são fases que intervém diretamente no humor das pessoas.
             Logo na primeira fase de uma espera, como esta que estou passando, apareceu a ansiedade. No momento a vida me reservou uma experiência nada agradável e tampouco fácil de aceitar, pois quando se trata de problema com a saúde, a gente fica meio “pirado”. Mas com o acompanhamento médico adequado, com o apoio da família, dos amigos e a fé que temos em Deus, ajuda e muito.
                A ANSIEDADE nada mais é do que querer viver o que ainda não veio o que ainda é desconhecido, ou seja, queremos ver e sentir o futuro, viver suas emoções, suas angústias e situações de respostas para todas as dúvidas que temos. É preciso que seja dito que a ansiedade é, na verdade uma tendência a viver no futuro, viver na incerteza e sofrer com ela, pois não a conhecemos. Não sei se podemos chamar isso de vida, porque a ansiedade provoca medo, dúvidas, inseguranças e sentimentos de fraqueza. E, convenhamos isso não é vida. Isso é sonhar acordado, ou um pesadelo sem fim que machuca, dói e agita. Prejudica a nós e aos outros que vivem conosco, e que são “obrigados’ a nos suportar. Portanto a ansiedade nada mais é do que resolver as coisas antes delas acontecerem, e como isso não é possível fazer, abrimos espaço para o medo que não nos deixa fazer nada, a não ter certeza de nada e nos torna chatos, doentes, deprimidos... xarope! E o pior que isso ocorre com 75 % das pessoas. Vivem dedicando atenção demasiada ao futuro que ainda não veio, desperdiçando sua inteligência e seu entusiasmo, suas energias em coisas que não conhecem. Puro desperdício de energia de vida, de alegria, de bom humor e tantas outras coisas boas.
                Passei por essa fase recentemente. É dose pra matar um leão a cada minuto. Coitado dos que convivem com a gente. Acho até que sofrem mais do que nós. Mas graças aos “ansiolíticos” diretos ou indiretos que o médico prescreveu, consegui voltar um pouco mais à realidade.
                Mas somos eternos doentes... Brasileiro adora remédios. Nós os homens, não temos capacidade de suportar uma dorzinha. Qualquer sinal estranho na unha do pé já motivo suficiente para pegar uma caminha e gritar pedindo mingau! É assim, e fazer o quê? Mas não é sinal de fraqueza, é pura “manha”. Essas coisas que os pais colocam nos seus filhos.
                Resolvido o caso da ansiedade acabei por me sentir melhor, mas não demorou muito e entrei em outra fase. Eu aguardava uma notícia importante, e ela não chegava. Eu olhava fixamente para o telefone e ele parecia sorrir debochando, como se dissesse; “enquanto estiveres me olhando eu não vou tocar”. Maldito, sem coração e sem pudor. Parecia se divertir com minha dor de esperar. Foi nesta fase que surgiu a AGONIA. Essa sim me fez sofrer. Eu tinha resolvido tão bem a fase anterior, mas agora retornar ao médico seria constrangedor, além de custar caro. Pensei: Espere aí, sou um homem adulto, maduro, tenho que entender que as coisas demoram... Mas logo que acabava de pensar assim, já sentia uma dor no peito e achava que ia morrer. A agonia também exige tratamento à base de mingau, mas tem que ter canela, aí fica mais eficiente. Cai na fatalidade de pedir a minha esposa um mingauzinho. Acabei ganhando umas tapas e aí senti que a fase da agonia não poderia durar muito. Dor no peito é uma coisa, ficar pensando em sentimentos mórbidos, agonizantes não deu certo. Os tabefes doeram mais que o peito. Reconheço que o médico usou um método mais científico, já minha esposa preferiu a prática aprendida em família: “escreveu não leu, o pau comeu". Achei melhor sair desta fase e dar um tempo. E o telefone ali, parecendo morrer de rir. Desgraçado, qualquer dia eu tiro a bateria dele, aí ele se cala para sempre. Mas eu dependia do maldito, ele precisa tocar para eu receber a notícia tão aguardada. Resolvi que não olharia mais para ele. Nojento...
                Depois da agonia resolvi que o melhor era mesmo esperar numa boa, sem essa de mingau ou arriscando a levar mais uns cascudos na cabeça, para deixar de “manha”.
                Não demorou muito e apareceu outra fase mais estranha ainda. A AFLIÇÃO. Essa sim veio com tudo. Cada vez que o telefone tocava o meu coração se movia como uma ginasta olímpica, realizando sua apresentação no solo no estilo da Daiane dos Santos. Chamar aquilo de salto era ser bondoso demais. A aflição provocava coceira, e o que é pior, coçava nos lugares onde as mãos jamais conseguiam alcançar. Além disso, fica chato pedir a todo o momento para alguém dar uma ajudinha. Vamos que a coceira seja num lugar meio constrangedor... Aí gera vergonha. Mas a aflição não durou muito tempo também. Mas fez um estrago danado. Acabei apanhando novamente, e jurei nunca mais falar em mingau com canela. Pensei, pensei, mas achei melhor ficar calado. A aflição chegava e provocava sensações inesperadas, vinha sempre à noite e antes de dormir. Deitava para descansar não sei do quê, pois passava o dia todo sem fazer nada e estava sempre cansado. Acho que estava cansado era de olhar para aquele telefone que parecia cada vez mais debochado. Pra evitar levar mais umas tapas, resolvi por conta própria acabar com ela.
                O tempo foi passando e já completava um mês desde a promessa de ser avisado por um telefonema, para iniciar o tratamento. Foi nesta época que veio a fase do DESEPERO. Eta fasezinha danada. Nada me agradava e meu cérebro só tinha espaço para destruir aquele telefone, mas isso era quase um suicídio, pois sem ele, aí sim que eu não seria avisado mesmo. Posso ser meio doido e nervoso, mas não sou tão besta. Pensei em procurar na agenda o número do telefone do hospital. Mas que barbaridade, a solução logo ali naquele papelzinho e eu nunca tinha pensado nisso. Liguei imediatamente e a Luciana atendeu.
--Bom dia, com quem eu falo? Perguntei seriamente...
-- Luciana, Setor de radioterapia do hospital. Em que posso ajudar?
                O espanto da mulher no outro lado da linha deve ter sido grande, porque dei um grito e pulei de alegria.
__ Luciana minha filha, eu estou aguardando há mais de um mês por um telefonema chamando para iniciar o tratamento de radioterapia e até agora nada.
__ Seu nome, por favor...
__ Paciente nº 8067.........., conforme consta na carteirinha do hospital.
__ Sr. Ferreira?
__ Isso mesmo,... Não deu tempo de responder e veio a reclamação:
__ Sr. Ferreira!!! Até enfim o senhor ligou. Estamos tentando há mais de dez dias um contato pelo telefone que consta na carteira do paciente, e quem atende é uma senhora levemente surda, que não entende nada do que falamos, e diz não conhecê-lo.
__ Mas eu deixei o número de dois telefones celulares para contato. Este telefone que consta na carteirinha não mais existe mais comigo, há mais de quatro anos.
__ Desculpe, mas aqui é o único número que consta.
__ Mas eu deixei escrito em um formulário com o Urologista que me recebeu na última consulta. Um médico angolano com um dedo enorme... Mas, isso não vem ao caso no momento, prefiro não lembrar o angolano, nem o dedo dele.
__ Ele não está mais aqui. Voltou para Angola.
                Filho da mãe; pensei comigo... Será que o negrão anda me procurando? Mas se foi para Angola fico mais aliviado, porque aquele dedo... É melhor não lembrar.
__Sr. Ferreira, iniciaremos o tratamento dia 25/10 as 11h00min. Estamos lhe esperando.
__ Muito obrigado, você não imagina o quanto esperei por esta notícia. Valeu. Tenha um ótimo dia.
                Desliguei e telefone e fiquei pensando, como podem ter me procurado no número antigo se há pouco menos de um mês fui informado pelo telefone celular, que deveria realizar mais alguns exames? Mas resolvi que não me preocuparia mais com isso, afinal a data já havia sido marcada, e era só uma questão de tempo.
                Mas às vezes penso, enquanto espero, que será muito bom chegar lá no hospital e confirmar que o “negrão angolano” realmente não está mais lá.
                Passado a fase do desespero é que compreendi que a vida tem dessas coisas. Fases após fase vão todos caminhando na direção da solução dos problemas, e que a quantidade de tempo que temos que esperar é na verdade, uma ESPERANÇA que se renova a cada instante.
                Vamos à Santa Casa, mas o negrão que fique lá por Angola... Tô fora, meu negócio é outro.
                Agora é só fazer a reserva do quarto na Clinica  Monassa, em Canoas, com a incansável assistente do Dr. Schermamm, enfermeira Dulce e começar o tratamento.
                Confesso que fico meio desconfiado, porque lá também existe o irmão dela, que é um baita negrão... Ainda bem que não é urologista. Aí meu Deus, será que estou ficando novamente com ansiedade?
                Mas se ele vier pro meu lado, largo tudo e volto pro litoral. Estou doente, mas não sou bobo.